terça-feira, 28 de fevereiro de 2012

Cidade Segregada...

Hoje fui assaltada pela primeira vez... É estranho, mas agente sempre sai com essa perspectiva na cabeça. Quando decidi ir caminhando da Sé até o Brás pensei: é fim de mês, tenho 12 pilas na carteira e poucos vinténs no banco... Já fiz esse caminho algumas vezes de bicicleta (emprestada na Sé) e sabia que ia passar por toda sorte de gente desvalida pelo caminho. Após a Catedral, pude vislumbrar um bonito pôr do sol destacando seus contornos. Já em frente, observei o viaduto pra ver se havia movimentação, e em seguida um par de maritacas me sobrevoou na algazarra costumeira das maritacas. Sem dúvida, muito melhor que a lotação da linha vermelha em horário de pico.

Ingressei no viaduto. A calçada é segregada por uma grande mureta. Passaram dois homens e uma mulher pra cá, atrás de mim não havia ninguém, no topo do morro avistei movimentação estranha, percebi os rapazes abaixados, mas titubeei em voltar pra trás, poderia não ser nada. Mas era.

Conforme fui me aproximando, vi que se levantaram e vieram em minha direção, já fiz sinal pra que ficassem calmos... acho que foi isso. Parece que reconheci um dos garotos, ou dois, ou mesmo os três. De certa forma penso que os conheço. Desde que passei pelo PETI em Mauá, o Andrezinho Cidadão em Santo André, e em especial agora pelo Ministério Público, enquanto "participo" da fiscalização das medidas em meio aberto e da Fundação CASA.

Eles também ficaram calmos, disseram que não queriam machucar ninguém (o reconhecível com um estilete na mão). Pediram dinheiro e o celular, que idiotamente respondi não possuir. Vagarosamente, abri a mochila e retirei a carteira, somente R$ 12,00 a habitavam. Argumentei: "é fim de mês". O celular se manteve calado. Insistiram. Retruquei. E o reconhecível decidiu encerrar o assunto. Agradeci... Agradeci em voz alta os rapazes que me assaltaram.

Segui meio atordoada e quis pular o muro pra ir pra pista. Um ciclista vinha vindo e o alertei sobre os rapazes, mas era como se precisasse dizer pra alguém que eu fora assaltada, e já da rua continuei avisando os transeuntes que seguiam pela segregada calçada. Era necessário falar, alertar as pessoas. Um rapaz deu meia volta e seguiu pela pista, junto aos carros que seguiam em alta velocidade. Saí do viaduto já com vontade de chorar. Tive medo da besteira que fiz em não entregar-lhes o celular.

Mas que merda não?

Há tempos venho querendo escrever sobre o que é o centro de São Paulo. Se existe purgatório, inferno e estas coisas, muitos já o vivem por ali. Ao mesmo tempo, uma cegueira paira sobre todas as pessoas apressadas que cotidianamente transitam no local. Também pudera, cheira a merda. Isso sem falar das barbas institucionais de Ministérios Públicos, Palácios da Justiça, Faculdades de direito, que ainda pensam se manter imaculadas, do alto de sua soberania, aos “judeus” que habitam suas portas.

Mas amanhã novamente vou dar aquela corridinha pelo calçadão pra não perder a hora, e contribuir para o nosso belo quadro social. Se a única moeda de troca que se tem é a violência, é ela que a teremos em nosso dia a dia. Não haverão prisões suficientes pra tantos pés de chinelo, e nem tantos tapetes vermelhos pra abaixo se empurrar tamanha sujeira...